sábado, 4 de abril de 2009

Cara a Cara


Luciane entrevista Luciane

Aparentemente sempre gentil e doce. Onde achas que depositas tua agressão?
Sou agressiva na minha docilidade. Acho que é aí que consigo ser ainda mais cruel quando preciso. E sei que isso desnorteia quem convive comigo. Acho que o pior golpe é aquele silencioso, que vem disfarçado. Venho me esforçando para ser declaradamente má quando necessário, para que as pessoas saibam o que sinto de verdade.

Mas como saber quando é necessário?
Quando meu corpo grita. Tenho me esforçado para tentar escutá-lo. Tentar sentir quando minha palpitação sobe, quando a ira chega, e poder declará-la na hora, a quem merece, ao invés de deslocá-la contra mim mesma e contra quem me quer bem. Porque sei que ao final do dia a derrotada sou eu pela minha própria agressão. Vou saber que é necessário quando meu corpo latejar e as veias pulsarem de um jeito diferente. Então tento aliviar essa pressão antes que vire enxaqueca, um mal que sempre me afligiu mas que tenho conseguido superar.

Sempre diz que ama escrever, que sonha em publicar um livro. Falta coragem?
Por incrível que pareça, acho que falta humildade. Eu tenho tantas idéias, acho o trabalho que eu faço tão rico de significantes, de material que eu poderia aproveitar, que parece que só poderia publicar algo se fosse brilhante, se emocionasse as pessoas. Na verdade é uma mega onipotência da minha parte, eu reconheço. Mas como eu duvido que conseguiria isso, essa grandeza literária, eu me calo. Eu espero. Por trás da minha aparente humildade sei que mora uma grande egocêntrica. E tenho vergonha dela.

Vergonha por que?
Porque acho feio a vaidade. E sei que não devia. Sei que ela é vital, e tenho exercitado isso. Mas ainda estou longe de lidar bem com esse meu lado. Tenho 1,80m e me encolho em festas. Faltam omoplatas e trapézios para fora. Meu circo fica todo encolhido. Sei que tento parecer mais uma quando no fundo quero ser o centro. É complicado. Só comecei a usar salto alto no ano passado. É uma questão de aceitar quem sou. Aceitar o meu tamanho. Tentar me afirmar. Minha altura até agora não tinha encontrado minha estatura. Agora preciso assumir que sou grande. Preciso lidar com a grandeza e a pequeneza de mim mesma.

Qual é o teu sonho? E o que está faltando para chegares lá?
Meu sonho não é um lugar concreto. São conquistas. São sensações que quero adquirir e outras que não quero perder jamais. Uma delas é a de ter um filho. Mas antes disso é preciso ter uma família. Acredito que um casal pode ser uma família antes mesmo dos filhos chegarem. Eu ainda acredito na família. Não aquele conceito decrépito da instituição família, moral e coisa tal. Me refiro ao sentimento família.
Sonho seguir trabalhando na minha área e escrever um livro sobre minha vivências. Ainda não sei que tipo de livro será. Se serão histórias, ficção, romance, poesia, ou um livro didático para profissionais da minha área. E, lógico, sonho com uma estabilidade financeira que me permita desfrutar de uma vida tranquila, poder viajar, comer boas comidas, viver aventuras novas. Mesmo que seja no mesmo lugar.
Mas o meu maior sonho mesmo, que é a base para todos os outros, é que meu corpo me permita viver muitos e muitos anos com saúde, para ainda poder sofrer, tremer, chorar, sorrir, ser feliz até se arrepiar. E tenho consciência de que não tenho esse poder sobre ele. Não governo meu corpo. Nós convivemos bem há 30 anos e eu cuido dele como posso para que ele não me abandone tão cedo.
E quer saber, acho que para chegar lá não falta nada. Eu já estou no caminho. Só preciso seguir acreditando nisso.

Mas será que já aprendestes a lidar com a solidão?
Ainda estou conquistando esse aprendizado. Acho que o maior desafio já não é mais o de lidar com a solidão, mas sim o de desvendar esse mundo todo que carrego dentro de mim. Poder diferenciar quem sou e respeitar isso. Ser minha maior serva.

5 comentários:

Nádia Lopes disse...

Lindo, é um baita exercício né?
Fiquei com vontade de encompridar a minha...ahahhaha
beijooo

pensar disse...

Oi Lu,

Bah essa foi genial, eu ri muito.'E demais expor,a reflexao, a busca, o entendimento.Mas o entendimento tem limite, ja a incompreensao 'e o horizonte.
Me vi refletida na pergunta de onde esta sua agressividade, e na dificuldade de por sapato alto.

Atualmente penso que nao sou o q eu penso que sou, pois se posso observar obviamente nao sou eu. Entao nao aceito nem rejeito, fluo.
Minha busca 'e ser cada dia mais humana, e acho que estou no caminho, se 'e q tem caminho;)
Bjs

Luciane Slomka disse...

Nádia, um mega exercício. Acho que fiquei a fim de me entrevistar tipo assim, umas 3 vezes por semana. :)

***

Oi Mari! Eu recomendo o exercicio. FAz a gente refletir muito. Mas acho que se a gente consegue se enxergar de fora ainda assim somos nós, só que de uma nova perspectiva, mesmo que seja apenas por um momento... Fica o desafio: Faz aí no teu blog um cara a cara com Mari! Beijo!

Cinthya Verri disse...

Belíssimo trabalho.
Beijo meu pra ti

Luciane Slomka disse...

Valeu Cynthia! Beijo retribuído e até amanhã, hopefully! :)