sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Só isso.

Tem dias que a minha humanidade me cansa.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Da urgência de sermos nossos regentes


"Minha alma é uma orquestra oculta; não sei que instrumentos tangem e rangem, cordas e harpas, tímbales e tambores, dentro de mim. Só me conheço como sinfonia."

(Fernando Pessoa em O livro do Desassossego)

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Carta para um velho safado


Prezado Charles,


Escrevo-te porque me preocupo contigo. Mentira. Escrevo-te porque preocupo-me comigo e sinto por ti um desprezo que me incomoda mas me atrai. Mal nos conhecemos, já li algumas coisas suas. Gosto, mas não muito. Confesso que isso tudo pode estar alojado em um violento asco pela maneira como você se refere às mulheres, mas acho que compreendo tal necessidade. Fato é que me parece apelativo esse seu caminho escatológico de lidar com a vida, com o amor e o sexo (Aliás, acreditas no amor?). Você parece fazer questão de expressar as palavras mais grotescas e chulas, achando que isso o torna um pessimista profundo? Desculpe, mas a mim não convence. Acho que você não sofre como faz parecer que sofre. Por exemplo, se eu escrever, no meio dessa minha carta, um 

"Hank, seu grande filho da puta. Por que não podes suportar me comer direito?"

todo mundo olharia diretamente para essa frase e interessar-se-ia por essa carta pelo simples fato de ver uma palavra suja, e consequentemente achar que algo desse teor estaria envolvido nela. As pessoas precisam que alguém extravase no lugar delas não é mesmo? Talvez você me ache uma romântica idealista e boba, e que meus textos cativam mulheres solitárias e mal amadas, apenas. Até pode ser. Eu sou uma solitária. Se não fosse, porque diabos estaria eu escrevendo uma carta a alguém que eu supostamente desprezo? Às vezes tenho pena de mim, ao contrário do que transpareço em minhas ultimas entrevistas na TV. Talvez não sejamos tão diferentes, afinal. Eu, fingindo uma profundidade atrás dessa rudeza e pequeneza feminina, e tu fingindo boemia e transgressão atrás dessa insegurança masculina.

A verdade é que hoje percebo que existem os homens, as mulheres e os escritores. Talvez a gente não tenha as habilidades normais das pessoas para nos relacionar. Eu não descobri o mundo através de uma barata como minha personagem Joana, e você, velho safado, não me parece ter comido tantas bundas como escreves. Somos mentirosos muito bem sucedidos, não lhe parece? E as pessoas nos adoram por acharem que somos verdadeiros e expressamos desejos que são ocultos em todos e que todos gostariam de colocar em palavras. 

Não sei, Buk (permita-me tal intimidade. Comecei essa carta para achincalhar-te e agora tenho em ti um rápido amigo) mas talvez meu sentimento de desprezo por ti esteja me atrapalhando e fazendo com que eu esteja te desrespeitando. Mas acho que isso não te preocupa nem um pouco, certo? Talvez eu precise fazer as mulheres me amarem, ao passo que tu necessita fazer com que elas te odeiem. Somos farsantes solitários.

Paro por aqui desculpando-me pelo desabafo, e agora não mais secretamente desejando que um dia quem sabe ainda possamos nos sentar juntos, depois de uma noite de amor, fumando um cigarro e tomando um bom whisky, para que tu me digas quem sou eu em teus olhos e me ensine um pouco mais sobre nossos podres todos.




Clarice



terça-feira, 22 de novembro de 2011

Parada

Será que você consegue compreender o que eu sinto? São apenas pequenos medos, aqueles de sempre. Um medo rápido que eu sempre sinto nas quartas-feiras é aquele em que eu começo a enxergar cada vez menos ouvidos à minha frente. Sabe, não há mais gente que saiba escutar. As pessoas amam falar e não suportam ouvir. Eu tenho medo de não ter com quem calar. As melhores coisas são aquelas que a gente consegue dizer com a boca depois de lamber com a alma. Sabe lamber um pensamento? Saliva também é ácida, suaviza e aliza as idéias. As boas se apuram, as idiotas afogam. Vai chegar um dia que todo mundo vai se encantar com programas de televisão e vai deixar de ouvir uma música linda só porque ela não está alta o suficiente para tirar as pessoas de suas ficções. Eu não sei o que eu sinto, eu tenho raízes amarradas com as de tanta gente e ainda assim igual a minha história ninguém tem. Mas eu gosto de enxergar aquelas pessoas com quem eu sei que divido sementes. No dia em que eu me embriago eu consigo sentir as minhas pernas bambas e isso me faz me sentir um pouco menos ridicula. Um pouco menos ingênua. Eu saio beijando bocas que não existem porque eu sou um pouco afônica. Ok, você nem sabe das minhas lutas, sei que você nem sabe de verdade quem eu sou, mas eu te olho nessa página e crio uma vida inteira para você. E na minha cabeça você é realmente ótima, sabia? Ótima e com muita sorte. Ótima e sempre cheirosa e pronta. Eu sigo sempre atrasada e sempre em vias de. Hoje essa luz está um pouco mais fraca que o de costume. Por ora nada gira, eu tomo uma coca-cola com bastante gelo no meu copo, acendo meu cigarro e paro de pensar.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Segunda-feira


Hoje é segunda-feira e um menino de 16 anos está prestes a morrer.

Hoje é segunda-feira e sei que inúmeros outros meninos, meninas, homens e mulheres também devem estar prestes a morrer. A diferença é que esse menino de 16 anos me conhece. Esse menino já pegou na minha mão. Esse menino já chorou comigo, revoltado por não poder mais jogar vôlei, ir ao shopping com os amigos, namorar.

Hoje é segunda-feira e já que sei que esse menino está prestes a morrer, nada mais parece ser assim tão importante. A reciclagem de lixo, a camada de ozônio, a globalização, os jogos panamericanos, a política. Tudo parece tão pequeno e ao mesmo tempo é dessa pequeneza desse mundo fútil e até bobo que esse menino de 16 anos já sente falta desde que adoeceu. Ele queria poder ter direito de viver toda essa bobagem que a gente vive. Toda essa futilidade televisiva e digital. Toda essa preocupação que a gente adquire quando cresce: trabalho, contas a pagar, prestações,... Futuro. Essa bobagem toda que se chama ilusão de futuro e que tanto nos angustia. Ele se preocupa com essa nossa estúpida ausência de futuro que ele percebe diariamente, estar se esvanecendo.

Hoje é segunda-feira e me dá um vazio no peito ao me sentir pequena e impotente perante esses caminhos que a vida vai nos oferecendo. Sei que a vida é assim, que essas coisas acontecem. Sei também que fui eu quem escolhi estar frente a frente com essa verdade, de forma diária e constante.

Mas eu sei que hoje é segunda-feira e que eu tenho a doce ilusão de ainda ter muitas segundas-feiras a minha espera. E eu sei que nessa história toda o que me entristece é o fato  de que, mais do que eu conhecer esse menino de 16 anos que está prestes a morrer, ele me conhece. Ele me olhou nos olhos e nesse olhar ele me roubou mais um pouco da minha ingenuidade. Mais um pouco da minha inocência. Isso me endurece um pouco ao mesmo tempo que me adoça. É dificil explicar. Eu não tenho medo da morte. Eu tenho medo é de não percebe-la e de não criá-la, para que quando ela chegue eu não seja pega desprevenida, em uma segunda-feira qualquer.

Hoje é segunda-feira e um menino de 16 anos está prestes a morrer.

Hoje é segunda-feira e, talvez, quem sabe, hoje, a vida faça um pouco menos de sentido. E faz?

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Rizomas

Sou de composição arbórea altamente fertilizável.
Em mim brotam flores, idéias e espasmos contentes.

Digo isso porque hoje sei que sou grama; é na hora que me cortam
que eu mostro meu mais inebriante perfume.

Mas precisarei me cortar para liberar o meu perfume?
E quando me acariciam eu mostro o que?

Pode ser uma suavidade entre atos de ira, mas ao final do dia o que sou é perfume.
Ah, quero teu olfato todo, senhor dos abraços e das pernas envolventes.

Sou tua porque me cheiro até a overdose.
mas meu perfume é como a água é definida pelos incrédulos.

Só amantes verdadeiros conhecem o perfume e o sabor da água.
E meu cheiro é assim: água para os outros, néctar para ti.

Já disse, sou frutuosa. 

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

das capacidades de se ser fragmentada

eu funciono em pedaços que são conectados por fraçõesdesegundosdeconsciência, misturados com meus pequenos delírios, com as inúme ras fantasias e todas as caixas de medo que carrego em meus corredores.

eu funciono em pe da ços quevi vem

como uma massa compacta que me faz assim como sou. percebo esses fragmentos

em muitas vezes como que agindo por conta própria, fragmentos livres de subjetividade e pequenas alegrias, soltos por aí procurando conexões. E eles vão sem destino, sem prazo de retorno e

eu não me assusto com isso. porque sei que eles retornam. retornam mais cheios, retornam mais crispados, com novos contornos que eu preciso avaliar antes de recebe-los completamente.

eu vivo de fagocitoses quase eletivas.

eu funciono em pedaços quentes e gelados, que deslizam hora como uma massa gelatinosa, hora como pedaços de algodão. por vezes parecem cimento,

mas
quase
sempre

são suaves. acompanham o fluxo do meu sangue e o ritmo descompassado do meu coração.

meus pedaços todos gostam de dias chuvosos como os de hoje.

Eu me encharco e incho.
Eu me fertilizo para que esses pedaços não parem de florescer.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Instruções em caso de pânico

Repousa tuas feridas abertas nas tuas coxas. Encolhe tuas pernas e as abraça forte, sentindo essas dores encostarem em teus seios cansados. Entrelaça teus dedos, como se as tuas mãos fossem uma massa compacta e suave. Encosta a testa nos teus joelhos feridos e fica assim quieta, respeitosa. Fecha os olhos e ouve tua respiração até ela encontrar o próprio compasso. Deixa as lágrimas que acaso cheguem desabarem sobre teu ventre recolhido. Agora espera e ouve. Não vês? Toda dor é viva e tua, e nunca estarás só.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Suicídio imortal

Já faz dois meses que eu me matei. Eu voluntariamente sofri um acidente e perdi a vida que eu tinha.


Com ela, tudo o mais partiu-se e partiu: Me despersonifiquei, me descorporifiquei, me desossei.


Hoje eu sou uma nuvem de idéias e filosofias baratas. Venho tentando me reorganizar e encontrar um novo corpo. Porque dores sem corpo não podem existir. E almas sem dores menos ainda. Procuro um corpo para alugar a minha dor.

Nesse meu necrotério não há esquecimento nem rasgos. Resta apenas uma sutil perplexidade. As pessoas não parecem mais humanas e eu escolhi permanecer me sentindo morta assim. Isso não é ruim. Não é solidão. É simplesmente um perído de autópsia que me traz uma vaga sensação de distanciamento, de pausa, como se agora eu estivesse regulada por uma velocidade íntima e particular.


Eu não morro por ninguém, mas vivo porque amo. Perdão, mas continuarei morta por mais um tempo. Até que meu óbito me faça sentido e esse meu cadáver dissecado volte a irrigar meus sonhos, minhas veias, e o cálcio fortaleça meus ossos para os meus próximos suicídios.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

CONCURSO DE CONTOS!

Dessa vez o post é para pedir aos que aqui me seguem ou mesmo para quem esteja apenas de passagem, passe no link abaixo e vote no meu conto, que está concorrendo nesse concurso! Desde já agradeço o apoio de vocês!

www.li3.com.br/clientes/euamoescrever/contos.php?chega-mais-perto&p=1313

P.S. O voto fica nos coraçõezinhos abaixo do título do conto!


sábado, 23 de julho de 2011

Era uma vez Para Sempre


Era uma vez Para Sempre.
Sua vida ia muito bem, casado com a Ilusão.
Um dia, ela fugiu com o Nunca Mais.
Foi então que ele conheceu Por Acaso.
Apaixonaram-se, e ela deu à luz ao Por Enquanto
E hoje vivem felizes, ao menos Para Sempre.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Por que só agora Cortázar?



Porque só agora eu entendo a beleza e o valor de cada palavra.

Porque só agora eu entendo quem ou o que pode ser a Maga.

Porque só agora ele mergulha em mim como

se suas palavras pudessem ser um pouco minhas

(Ah, como eu queria,... Como eu as quero).

Porque eu estou pronta para Cortázar.

Por que só agora Cortázar?

Porque só agora Luciane.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Esse corpo que deita ao meu lado

Esse corpo que deita ao meu lado dorme e não sabe que eu o olho e que enquanto eu o olho eu sinto dor. Sinto dor porque eu não o entendo completamente. eu ainda não decifro cada silêncio, eu ainda não compreendo cada respirar, cada olhar. Eu não sei quando a dor que me dói é a dor que lhe dói e que eu possa, então, ajudar a aplacar. Eu ainda não sei que meu silêncio corpo presente pode ser um carinho imenso e que as coisas que eu não falo podem ser as que mais irão fazer sentido para sua dor. Eu ainda não sei bem dos nossos novos silêncios.



Esse corpo que deita ao meu lado sabe que eu sei que ele anda no comando de uma alma que o ocupa e que eu gostaria tanto de enxerga-la toda e mostra-la para que ele entendesse que essa dor não é dele. Mas então minha alma enxerga o corpo dele e faz com que eu enxergue o meu próprio corpo quebrado e então minha alma, o corpo dele, a alma dele e meu corpo se mostram a mim como se estivessem num debate furiosamente calado. São quatro moradores de uma casa que sente nossos vazios, que também não oferece palavras de conforto algum para nossas dores. São batalhas pessoais, e eu olho para esse corpo que deita ao meu lado e me comovo com nossas lutas individuais em nossa deliciosa e dolorosa companhia.



Eu olho para esse corpo que deita ao meu lado e ele é o meu.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Tecendo amanhãs



Eu sinto cada passo que dou ecoar dentro do meu corpo como tambores fortes que anunciam novas chegadas. Dias em que cada passo parece uma promessa, em que a gente deita sobre as perdas e cobre-se de desejos, esperando que o frio passe. Esperanças sempre aquecem, mas não debelam invernos. Eu sigo insistindo que viver é esforço, viver de verdade é análise sem teoria alguma, é tatear desejos e medos buscando formas que não existem. Viver é dificil, exige esforço, exige estar atento. E quando a gente parece estar entregue, ainda seguimos vivendo. E a vida acontece em nossas desatenções, em nossas distrações.

Ontem eu pensava se querer é poder. Claro que sim. Mas poder é escolher. E escolher é ato, escolher é decisão consciente. Portanto, traz responsabilidade. E estamos a todo momento sendo testados por isso, se vamos mesmo assumir essa responsabilidade. Até quem acha que não tem escolha está escolhendo ser vítima do tal destino.


Eu já falei isso mil vezes, de que eu não acredito em destino, não acredito na tal "hora das coisas acontecerem.". E ainda assim sou uma esperançosa assumida, sou uma otimista incorrigível. Mas acredito em mim, acredito nas pessoas. talvez eu so esteja um pouco cansada, mesmo com meus poucos 33 anos de vida, tem dias que o sangue parece estar correndo mais espesso pelas minhas veias, tudo mais lento. eu sempre lembro de algo que ouvi um dia, que nossas células a cada certo número de anos mudam todas, nossa pele está sempre morrendo e renascendo. Então o que fica? Como vamos acumulando quem somos se as marcas da vida se passam em nosso corpo e nem ele é mais o mesmo?


Quando olho fotos minhas de criança fico tentando desvendar quem eu era. O que se passava na minha cabeça e quais eram meus sentimentos naquela fase da minha vida. E eu não lembro deles, lógico. Mas eles não se foram, eles apenas se tranformaram. E se hoje eu sou consequencia da criança que fui, dos pensamentos que eu tive mas não lembro mais deles, começamos de onde? E onde isso tudo vai parar?


Sigo amanhecendo e tecendo esses amanhãs que nunca chegam.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Notícias de uma surdez

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A menina era tão muda, mas tão muda, que um dia floriu.

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quinta-feira, 5 de maio de 2011

Refem da delicadeza


Eu amo a comunicação e o poder das palavras. Amo o poder dos gestos, amo a comunicação que tem um olhar, amo como um toque pode gritar, amo como uma possível presença pode acelerar o coração.

Eu acho a delicadeza uma força. Eu enxergo a delicadeza como algo palpável, concreto, eu acho que posso agarrar a delicadeza. Mas ela não é dura nem permanente. A delicadeza é líquida. Eu sou a suavidade do que quero me tornar. E não sei nem se as pessoas entendem o que isso significa e o quanto eu acredito no poder do encontro.

Talvez a delicadeza e a razão sejam antagônicas. A matemática dos afetos me parece a mais exata das ciências

Na verdade eu penso que estamos todos em eterna negociação com nossa delicadeza. Somos reféns dela. O cativeiro é a vida, e não há resgate.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

quinta-feira, 24 de março de 2011

Contra um mundo melhor

Os livros mais legais que eu já li tem em sua lista vários que foram encontrados por mero e maravilhoso acaso, sem nenhuma intenção ou indicação prévia. Com esse a história se repete. Aleatoriamente vendo livros em uma livraria me deparo com esse título que já me conquistou de imediato: "Contra um mundo melhor", de Luiz Felipe Pondé. Interessante título, pensei. Dei uma folheada, vi que eram ensaios de um filósofo. Mais interessante ainda. Arrisquei e comprei.

Ontem comecei minha leitura naquela hora ingrata antes de adormecer, quando pegamos um livro só por aquelas poucas linhas que rapidamente vão trazer nosso sono para a margem e o livro termina se fechando minutos após ter sido aberto. Dessa vez foi diferente. Li metade do livro e só fechei porque meu superego me obrigou a pensar nas poucas horas de sono que eu teria se não fosse logo dormir.

Ele é ácido, é crítico e nos faz repensar nossa dita ética, nossa moral, nossa eterna necessidade de aprovação. Ele defende o nosso caos, ele protege nossa infelicidade e nos permite rir de nossas humanas mesquinharias. Seguem alguns trechos que me impactaram:

"Somos escravos da felicidade, mas é a infelicidade que nos torna humanos"

"Sim, eu acredito na infelicidade como matéria de vida. Não que a procuremos, nem precisa, ela nos acha, mas creio na infelicidaqde como medula, espinha dorsal de nossa dignidade. A infelicidade é a lei da gravidade que reúne os elementos que compõem nossa personalidade. Imagine se Hamlet só quisesse ser feliz?"

"De lá para cá, a moda de todo mundo ser indivíduo gerou, na realidade, grande inveja e ódio por quem de fato é individuo e suporta a solidão de sê-lo. Além do mais, a midia e a arte vendem modelos de individualidade nas liquidações de material de autoajuda, infestando o mundo de idiotas ruidosos enquanto os verdadeiros e infelizes individuos se escondem pelas florestas das cidades, como uma espécie caçada, em extinção"

"Proibiremos tudo que um idiota científico considerar inútil para o sucesso físico. Algo se perde nessa dança miserável. O que se perde é o fato de que a vida é desperdicio de si mesma. Sua grandeza está em perde-la, como ja dizia a sabedoria do Evangelho, e isso nao mudou. A tentativa de conte-la nos limites da "ciencia da nutrição" não passa de um modo hipócrita de negar o principio da vida - que é se multiplicar, se esvaindo, se perdendo, como que sangrando para gerar. O que alimenta a busca da saúde total é a velha e feia ganancia como qualidade de carater. Quando me encontro em jantares inteligentes em que tudo é organico e equilibriado, me sinto entre vamprios que sugam o mundo, em vez de se oferecer a ele como alimento permanente da vida".

segunda-feira, 21 de março de 2011

Protesto

Uma criança aqui fora grita em bom som: "não quero mãe, eu não quero!" e tudo isso acontece enquanto eu me pego a pensar sobre as não respostas e a nossa total inabilidade de sabermos quais são as perguntas.

Não acho que somos bons em comunicação, não acho que conseguimos ter discernimento suficiente do que sentimos e quando sabemos o que sentimentos não sabemos diferenciar o que pode ou não ser falado. E calamos tantas vezes. E calando agredimos e somos agredidos por nossos pensamentos sufocados.

Quando eu penso que aprendi a pensar eu sempre lembro de algo ou vivencio alguma situação que me traz de volta a essa simples dificuldade de sermos gente. Não acho isso bom nem ruim. É apenas fascinante o quanto, ainda assim, é apaixonante ser gente, tentar se comunicar, tentar expressar o que sentimos para quem devemos, dar-nos conta da nossa limitação e da nossa dificuldade de gritarmos para o mundo parar quando a gente precisa.

Não que ele pare, porque ele obviamente não para. Mas é bom gritar, não é?

terça-feira, 15 de março de 2011

Imprecisões preciosas

É preciso que haja alguma explicação nessa vida para essas coisas sem tamanho e sem medida. Sei lá que dias são esses em que a gente se acorda questionando o porquê disso aqui tudo, o porque da saúde, da doença, da vida, da morte, dos desastres, dos milagres e de como a gente faz para seguir respirando.

Eu entendo das nesnecessidades e das futilidades e sei que isso tudo é caminho. Respeito as imprecisões e sei que são justamente elas as responsáveis por nos levarem aos melhores destinos.

Mas tem dias que as não regras e as não ordens me perturbam e me deslocam. Nesses dias eu queria algum tipo de bula, algum tipo de ordem, algum tipo de rota. E o mais incrível de se descobrir - e só sei agora - é que essa sensação de uma desolação pequena, sutil, simplesmente aquele pedaço da gente que se pergunta o porque disso tudo, acontece sempre (a quem se deixa), independente de estarmos felizes, completos (hein?), com o coração bem ocupado, com uma profissão bem definida e bem escolhida. Essa inquietude não se resolve como prêmio de consolação para quando a gente atinge essa tal serenidade. Talvez porque essa imprecisão que eu sinto agora seja boa, seja vital, seja o que tenha me feito voltar aqui de novo.

Eu sei que a imprecisão é preciosa. Mas hoje, só por hoje, eu queria um porto seguro para descansar do meu navegar.

domingo, 30 de janeiro de 2011

O prêmio do esquecimento


Ela achava que vivia esquecendo das coisas. Se considerava atrapalhada e ansiosa, essa mulher. Enfrentando suas tempestades sem guarda-chuva, sem capa nem sapatos. Cansou de se encharcar sempre, de se atrapalhar sempre, e decidiu proteger-se das águas tentando antecipar os maus tempos. Achava que assim conseguiria manter-se mais alerta. Ela, que na verdade nem sabia que nunca havia aprendido a dura lição do esquecer.

Esquecer não é defeito. Esquecer não é negar. Esquecer é assumir a ingenuidade de que estamos vulneráveis mais e outra vez se não entendermos que a vida não é acaso. É escolha. Mas, ainda assim, não podemos prever nada. Esquecendo ou não, escolhendo ou não, não há previsão de tempos. Nem metereológicos, nem lógicos ou ilógicos.

Ela acreditava que poderia esquecer das suas enchentes se não lembrasse mais delas, se passasse seu tempo protegendo-se delas. Sempre cabisbaixa, seguiu em sua vida olhando para o chão para não ficar temendo o céu.

Então, acontecimento do destino ou do que vocês prefiram chamar, um grande temporal veio. Ela, tentando tanto ocupar-se de poças de suas antigas pequenas garoas, e de buracos e pedras do chão, nem ouviu o som dos trovões que anunciavam o perigo bem a sua frente. As chuvas vieram e derrubaram sua casa, destruíram seus móveis, levaram suas roupas, quase a afogaram. Enquanto enxergava impotente as águas levarem tudo que ela tinha, pensava em quantas coisas esquecera junto com o medo das tempestades. Quantas pessoas ela já quis, já perdeu, já não quis. Ela não vinha perdendo o medo das águas. Ela não vinha esquecendo nada. Vinha perdendo o gosto da vida e dos amores mal vividos e por isso mal esquecidos.

O sol voltou e secou tudo que havia sobrado. Secou suas pernas longas, seus cabelos loiros e a lição de que, na vida, não se esquece de nada. Vive-se recordando, revivendo, relembrando sempre que for preciso, para então finalmente esquecer.

Porque o esquecimento é um prêmio, que só recebe quem tem a coragem de viver as dores de suas memórias até o fim.