
Eu quero vomitar. Ninguém escreve a palavra vômito. A sonoridade dela nos é feia porque associamos a palavra ao ato, e ninguém gosta de vomitar. Pois então eu quero vomitar e quero escrever o que ninguém aguenta, eu quero ler e ver tudo aquilo para o qual as pessoas tapam olhos e ouvidos. Porque eu nao consigo tapar os meus, mesmo quando eu tento, e por isso escuto e vejo tudo.
E escuto o que não quero, escuto o que nem mesmo é dito, escuto corpos, escuto olhares e por vezes escuto demais, escuto o que é da minha voz e não da voz do outro.
Tem dias que eu pareço tão porosa e cansada que preciso gritar e preciso falar e digitar, mesmo temerosa sobre como essas palavras serão interpretadas. Mas na verdade não quero obter qualquer tipo de gratificação ou crítica. É como se eu fosse um diário para mim mesma e para quem quiser chegar perto e me ler, porque eu já me desencadeei.
Eu li há poucos dias que há gente que já nasce póstuma. Ninguém quer deixar de ser lembrança, de ser semente. Eu ainda não estou certa do que venho deixando de legado, porque ainda estou vivendo os meus, para aproveitar os que me servem e vomitar os que me empurraram goela abaixo.
Agora eu já não sei se me olho no espelho todos os dias para lembrar de quem eu era e lhe dar adeus, ou se é para acompanhar quem eu me tornarei. Não sei exatamente para onde estou indo, mas isso não tem mais me tirado o sono. Tenho sorvido goles de calma, apesar dos engasgos de medo; e com o devido cuidado para não me embriagar. Porre de calma anestesia a vida.
Minha ressaca é das doses de verdade que eu venho tomando todos os dias. Uma dependente dessa droga que me cansa, mas me salva. Eu sou um poço de perguntas, um jato de idéias, um chafariz de descobertas, um muro de indagações, ventania de amor e solidão. Eu sou o que eu nunca imaginaria ser, eu me torno o que preciso, e eu não serei o futuro que eu nunca imaginei.
Por tantas vezes eu sinto medo do futuro não chegar, sinto medo de não estar percorrendo o trilho certo. Ou será que é o medo de ter finalmente descoberto que não existem trilhos, que o caminho é campo aberto, mata fechada esperando pelo meu facão?
Eu sou o fio do meu facão. A tênue linha entre o caos e a razão.
Eu sou o medo de (me) perder.
Eu sou a perda.
E tu, quem és?